9 de agosto de 2012

O cinema prejudica o amor (?)


"E o que tem de se fazer é abolir urgentíssimamente o braço das cadeiras no cinema, para que fiquemos mais juntos e todos se possam abraçar e fazer de duas cadeiras uma, de duas pessoas uma, de uma sala de cinema uma, sem que um braço intrusivo nos separe. Um braço que só serve para encaixar pipocas e separar gente.

Eu não quero pipocas, quero, sim, abraçar a pessoa que tenho ao lado sem que nada nem ninguém nos separe. Eu não quero um braço a mais, já tenho dois, obrigadinho, quando muito aceito outros dois que se unam aos meus. Quero, pois, que retirem este braço, que se promovam as cadeiras manetas no cinema, que se deixe cair um braço para se ganharem quatro. Ouçam-me que falarei agora alto: o braço das cadeiras já separou mais pessoas que o Muro de Berlim, que os beliches da Moviflor, que as políticas do Fidel.

O braço das cadeiras no cinema é Mao Tse Tung, é Estaline, é inquisição espanhola, é noite gélida em Berlim, é despedida para sempre no aeroporto. Daí ser tão urgente retirarmo-las, dispensando um braço, é certo, mas ganhando duas pernas entrelaçadas, duas bocas juntas, mãos livres para celebrar a liberdade e dois braços, quatro, os que houver, para que o filme nunca acabe na sala de cinema mas que corra connosco pelo corredor fora. Há, pois, um braço que nos separa do mundo. E não tenho dúvidas de que é este: o das cadeiras do cinema."

( de Fernando Alvim publicado no jornal i )

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